Entrevista: Reestruturação para novos tempos é foco do Inpa


 05/03/2012 – O biólogo Adalberto Luís Val é um profundo conhecedor da realidade do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). Ele completou no ano passado 30 anos de atividades na instituição, onde, além de atuar como diretor, desde 2006, desenvolve pesquisas sobre a respiração e as adaptações dos peixes da Amazônia às modificações do meio ambiente.

Doutor em Biologia de Água Doce e Pesca Interior, pelo próprio Inpa, e pós-doutor pela Universidade da Columbia Britânica, no Canadá, nesta entrevista para a Agência FAPEAM, ele fala um pouco sobre o seu trabalho como diretor do Instituto, sobre os projetos para preparar a instituição para atender aos novos paradigmas da economia mundial. Além disso, pontua as realizações e o grande desafio de repor o quadro de pesquisadores e anuncia a autorização, pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), para a realização de concurso público ainda este ano.

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Agência FAPEAM – Quais os focos de ação do Inpa para 2012 dentro do planejamento estratégico?

Adalberto Val – Nos últimos anos passamos por uma profunda reforma de infraestrutura institucional. No ano passado, foi implantada uma nova estrutura administrativa, reformulando a organização institucional em torno de quatro focos de pesquisas: biodiversidade; dinâmica ambiental; tecnologia e inovação; sociedade, ambiente e saúde.

Essa reorganização institucional está voltada para dotar o instituto de uma administração moderna. Como as questões que surgem no mundo moderno são muito amplas e demandam a participação de vários grupos de pesquisa, com focos completamente diferentes, a ideia foi colocar os grupos de pesquisa em contato diretamente entre si.

O instituto possui alguns objetivos fundamentais: não só o de aprofundar os processos de produção da informação, mas também o de ajudar nos processos de capacitação de recursos humanos para a Amazônia. Queremos viabilizar a socialização da informação. Não acredito que possamos avançar de forma efetiva com desenvolvimento do País sem um processo bastante eficiente no que se refere à socialização da informação de uma maneira ampla, geral e irrestrita. A sociedade bem informada contribui de forma muito mais efetiva com o desenvolvimento nacional. É importante que nos preparemos para as bases de um novo modelo econômico mundial, onde o foco deverá ser ciência, tecnologia e inovação, conservação ambiental e educação.

AF – Qual o balanço que o senhor faz da sua gestão à frente da Inpa?

src=https://www.fapeam.am.gov.br/arquivos/imagens/imgeditor/valf3.jpgAV – Do ponto de vista de gestor da instituição fui muito afortunado. Primeiro porque conheço muito bem a instituição. Segundo, constituímos uma equipe de trabalho de altíssimo nível. Além disso, tive a confiança do MCTI, que estava e está vivendo um momento especial no financiamento da ciência e tecnologia. Esse momento se reflete nos demais Estados do País com destaque especial para o Amazonas, que criou a Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia e a FAPEAM. Sendo o Inpa uma das instituições importantes do ponto de vista da produção da ciência e tecnologia, nós rapidamente nos estruturamos para se valer e utilizar essa nova configuração que o País estava desenhando.

Pudemos fazer uma revolução institucional do ponto de vista da infraestrutura e dotamos os laboratórios com os melhores equipamentos. Não mais um processo de transição lenta. Nossos mais de 600 estudantes de pós-graduação estão, ou têm a oportunidade de trabalhar com equipamentos que existem nas melhores escolas do mundo.

AF – O que ainda falta concretizar?

AV – Temos uma carência grande de profissionais. Poderíamos ter hoje mais 300 cientistas, com nível de doutorado, trabalhando nos laboratórios do Inpa. Estamos trabalhando nessa questão desde o primeiro momento, mas ainda não conseguimos resolver. Contornamos a situação por meio de cooperações com instituições amazônicas, brasileiras e do mundo. Avançamos muito, mas precisamos avançar mais. Já fomos mais de 400 pesquisadores. Atualmente somos 200. Com a estrutura que temos na instituição poderíamos avançar de forma mais significativa.

AF – Qual seria o caminho para atender à demanda do Inpa por recursos humanos?

AV – Precisamos fazer concursos. Não há outra forma de fixar recursos humanos na Amazônia. Evidentemente que a ciência brasileira deve passar por novos marcos regulatórios, que incluem os processos de contratação de pessoal, com a possibilidade de dar mais flexibilidade para esse processo. Precisamos de um sistema em que o indivíduo possa conquistar sua posição no mercado de trabalho, mas já estando empregado. O profissional, depois que passa pelos processos de capacitação, precisa de um emprego. Nós precisamos viabilizar essas formas efetivas de manter o pessoal qualificado na região. Bolsa de estudo é um instrumento de capacitação de recursos humanos e não de fixação desses profissionais nas instituições.

 AF – Existe a possibilidade de haver um concurso para o Inpa?

AV – Existe um movimento para resolver a questão de recursos humanos. Ele vem desde o ministro Sérgio Rezende, passa pelo ministro Mercadante e chega agora ao professor Marco Antonio Raupp, que assumiu a pasta recentemente. Ele foi membro do conselho diretor técnico-científico do instituto, que é o mais alto órgão do Inpa e conhece como ninguém o problema de falta de pessoal na Amazônia. Temos perspectivas efetivas para resolver esse problema. Já há uma autorização para contratar pessoal. Devemos ter um concurso este ano para uma parcela importante deste número que estamos pleiteando. No entanto, precisamos avançar nesse processo de reposição do quadro, pois temos uma perspectiva de redução de pessoal em, aproximadamente, 60% da quantidade atual até 2014, principalmente devido às aposentadorias.

AF – Qual a importância da parceria e fomento do Governo do Estado, por meio da FAPEAM, para o desenvolvimento das atividades no Inpa?

src=https://www.fapeam.am.gov.br/arquivos/imagens/imgeditor/valf4.jpgAV- A FAPEAM teve um papel de nucleação fundamental para a região como um todo. Serviu de modelo inclusive para outros Estados da região no processo de estruturação da atividade de C&T. Isso porque, fundamentalmente, não há como fazer uma administração moderna sem que se tenha um conjunto de informações robustas e, para produzir informações robustas, precisa-se de investimentos. Quando esses investimentos foram disponibilizados, o Inpa, enquanto uma instituição já consolidada na Amazônia se apresentou inteiramente no sentido de ajudar nesse processo. Isso se deveu ao fato do instituto estar estruturando. Ele estava pronto para receber imediatamente investimentos e produzir as informações. Foram vários avanços institucionais por conta desse suporte proporcionado pela FAPEAM. Destacaria também a capacitação de recursos humanos. A FAPEAM é uma das ferramentas mais importantes nos processos de capacitação e fortalecimento da infraestrutura de pesquisa no Estado.

AF – Quais projetos o senhor destacaria?

AV – O primeiro refere-se aos investimentos na capacitação de recursos humanos, em todos os níveis, desde a iniciação científica, até o mestrado e o doutorado. O segundo grupo de projetos são os de interação com as agências federais, na qual destaco o grupo dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs). Eles colocaram o Amazonas em destaque nacional. O fato de o Estado ter mais projetos do que vários outros lugares do Brasil gerou um posicionamento extremamente importante. Precisamos agora administrar com bastante grandeza, para que possamos avançar e tirar bons resultados.

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AF – O Brasil sediará este ano a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio +20. Diante da importância política no cenário mundial para o desenvolvimento sustentável, quais as perspectivas de participação do Inpa neste evento?

AV – O Inpa está participando em iniciativas regionais e nacionais. No âmbito nacional estamos envolvidos com o MCTI, a Academia Brasileira de Ciências e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) em várias atividades. Também estamos envolvidos em uma iniciativa da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), que acontecerá na PUC do Rio de Janeiro. Dentre as ações regionais, pretendemos expandir as discussões para os lugares onde o instituto tem atuado, principalmente onde possui núcleos regionais. Temos um envolvimento especial com o Estado do Amazonas para discutir essas questões. O Inpa está organizando um seminário com vários parceiros que acontecerá no Rio de Janeiro.

AF – Qual é a mensagem fundamental que o Inpa leva para a Rio+20?

AV- O mundo vem discutindo atualmente a questão da economia verde. Como conciliar a economia verde com os desafios que se impõem sobre a floresta, mas que não nascem dentro da floresta? Precisamos primeiro entender isso, depois desenhar estratégias com bases científicas para que possamos permitir um avanço com inclusão social e geração de renda. Elas estão intrinsecamente ligadas e relacionadas a ambientes altamente conservados, como temos na Amazônia. Mas precisamos de educação e informação científica e tecnológica. Precisamos de educação nesse processo. Economia verde não é só manter a floresta. É um conjunto de ações em diferentes níveis da organização social que requerem informações robustas.

AF – Como o senhor avalia o cenário da pesquisa no Brasil e no Amazonas?

AV – Existem dois momentos da pesquisa brasileira. Tivemos um longo momento de estruturação da pesquisa. No entanto, faltavam fontes de financiamento. Nos últimos dez anos presenciamos uma revolução científica. Criamos as bases para um avanço competitivo em nível mundial. Evidentemente que vamos entrar num processo de estabilização, em que é necessário fazer uma avaliação de quais áreas precisam de mais investimentos. Por exemplo, as áreas da engenharia precisam de uma revolução, principalmente voltada para inovação. Mas ainda faltam muitas informações na área de biodiversidade.

src=https://www.fapeam.am.gov.br/arquivos/imagens/imgeditor/valf2.jpgDo ponto de vista regional, o grande divisor de águas foi a criação do Sistema Estadual de Ciência e Tecnologia. Como isso não existia nos demais Estados, foi um divisor de águas para a região como um todo. Acredito que as pesquisas em biodiversidade precisam continuar avançando. Além disso, são importantes os investimentos na área de biotecnologia e também é necessário pesquisar os efeitos das mudanças climáticas na região, estudando o que acontece no solo e a forma como isso afeta as pessoas, a pesca, a economia regional e a produção de frutos.

AF – Qual a contribuição e o legado que o Inpa deixa para a sociedade amazônica diante de sua missão em gerar e disseminar conhecimentos e tecnologia, e capacitar recursos humanos para o desenvolvimento da Amazônia?

AV – Vamos imaginar que o Inpa não existisse. O que conheceríamos hoje em termos de biodiversidade regional e dinâmica dos ambientes da Amazônia? O Inpa formou cerca de 1.500 mestres e doutores. Profissionais capacitados com doutorado estão atuando nos programas de pós-graduação na Amazônia e muitos dos nossos egressos são secretários de Estado em vários lugares, inclusive nos demais países amazônicos. Se tivesse que destacar um legado, este estaria relacionado fortemente à geração de informações para inclusão social e geração de renda. É o legado da informação e da capacitação.

 Anália Barbosa – Agência FAPEAM

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