Conceito de meio-ambiente ainda é pouco compreendido


Pesquisa com moradores do entorno da Reserva Ducke demonstra que o sentido de “meio ambiente” ainda é muito abstrato para a maioria das pessoas

O uso da palavra “coisa” no discurso de alguém pode ter muito mais significado do que simplesmente falta de vocabulário. Em termos de análise de conteúdo, oferece detalhes sobre a maneira de pensar do indivíduo. A utilização repetida desse substantivo pode indicar, por exemplo, falta de conhecimento sobre o assunto evocado ou ausência de um termo apropriado para designar aquilo a que se quer dar nome. Ou seja, na falta de vocabulário apropriado, surge a palavra “coisa”. 

 
Em pesquisa realizada com a população do entorno da Reserva Ducke, o substantivo foi citado diversas vezes quando as pessoas tentavam definir “meio ambiente”. De acordo com Genoveva Chagas de Azevedo, autora do estudo, a utilização de “coisa” no discurso dos moradores pode significar que, para eles, o conceito de meio ambiente ainda é algo muito abstrato. Ou ainda, ao utilizar uma palavra vaga, os moradores mostram um certo grau de desconhecimento em relação ao tema.

 
Um dos entrevistados disse que meio ambiente “significa muitas coisas, muitas coisas que a gente não sabe também”. Segundo a pesquisadora, eles não sabem ou não conseguem explicar o conceito de meio ambiente. Além da população do entorno, Genoveva coletou a opinião de pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) que desenvolvem trabalhos na Reserva. Os resultados da análise foram publicados no livro “Representações Sociais de Meio Ambiente: A Reserva Florestal Adolpho Ducke”, publicado com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam).

 
Um dos objetivos da autora foi entender qual a representação social (percepção coletiva) que moradores e pesquisadores têm do meio ambiente e da Reserva Ducke, ou seja, as idéias, as imagens, concepções e visões que eles têm sobre tais assuntos. Utilizando técnicas de associação livre de palavras e de entrevista semi-dirigida, Genoveva chegou a resultados bastante diferentes entre os grupos amostrados.

 
A representação social que os pesquisadores têm de meio ambiente está diretamente relacionada a aspectos conceituais da área de conhecimento a qual eles pertencem, ou seja, às características físico-químicas e naturais dos ecossistemas. Já para os moradores, meio ambiente está ligado ao senso comum – opiniões, informações veiculadas na imprensa e conversas informais com pessoas de seu convívio.

Em relação à Reserva Ducke, os pesquisadores apontam ter um significado pessoal e afetivo com o local, em razão principalmente das pesquisas desenvolvidas na unidade.  Por outro lado, parte da representação social que a comunidade tem da Reserva traduz-se em um discurso de proibição e inacessibilidade. Esses sentimentos geram curiosidade em relação ao que a unidade de conservação abriga. Os moradores sabem que não devem entrar, mas não sabem explicar exatamente o porquê disso.

 
A pesquisa mostra que a população tem vontade de conhecer mais sobre a Reserva. Um dos moradores afirma: “Por uma parte, ela (a Reserva) é boa, ela é boa porque mais que (sic) a gente não possa entrar, eu pelo menos tenho curiosidade de entrar e conhecer tudo aí dentro, (…) mas eu tenho medo por causa da insegurança (sic), mas eu acho ótimo”.

 
Diante dos resultados do estudo, a pesquisadora sugere que o Inpa dialogue mais com a comunidade, explicando sobre a importância científica e ambiental do local. Genoveva recomenda ainda que o Instituto elabore uma cartilha ou um livro com linguagem acessível, a fim de que a publicação traduza o conhecimento científico para os moradores e os sensibilize para auxiliar a instituição a manter a Reserva protegida.

 
Pressão sobre a Reserva

De propriedade do Inpa, a Reserva Florestal Adolpho Ducke possui uma área de 100 milhões de metros quadrados de mata primária. Ela é utilizada como base de suporte para o desenvolvimento de pesquisas do Inpa e de outras instituições, portanto, seu acesso é controlado.

 
De acordo com a pesquisadora Maria Inês Higuchi, coordenadora do Laboratório de Psicologia e Educação Ambiental do Inpa, a maior ameaça à unidade é a ocupação urbana. A proximidade da cidade com a área florestal já causou vários impactos à Ducke, como a existência de clareiras na floresta, a derrubada de árvores e a depredação da vegetação rasteira.

 
Além disso, há o uso inadequado de recursos naturais da reserva (madeira, frutas e animais) apesar da intensa vigilância. Os recursos hídricos já sofrem também a poluição que adentra centenas de metros no interior do local, segundo Maria Inês.

 
LIVRO: Representações Sociais de Meio Ambiente: A Reserva Florestal Adolpho Ducke
AUTORA:
Genoveva Chagas de Azevedo
EDITORA:
Editoria da Universidade do Amazonas (Edua) / Editoria do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa)

Andréia Mayumi – Agência Fapeam

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