Pesquisa e monitoramento garantem preservação de gavião-real
04/09/2012 – A coordenadora do projeto Gavião-real (Harpia harpyja), com pós-doutorado em Nicho Potencial de Harpia pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Tânia Sanaiotti, contou em entrevista exclusiva à Agência FAPEAM um pouco do trabalho desenvolvido para a preservação do gavião-real. Ela explicou que as ações são desenvolvidas em comunidades amazônicas por meio de atividades de educação ambiental e por meio do trabalho de monitoramento e identificação de locais onde os ninhos estão localizados. Cientista do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), Sanaiotti disse que o trabalho de conservação do animal iniciou em 1997, após a descoberta do primeiro ninho em uma floresta de terra-firme, próxima de Manaus. Hoje, são 75 ninhos mapeados em todo o Brasil.
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Agência FAPEAM – Como tem sido feito o desenvolvimento do trabalho de mapeamento e monitoramento dos ninhos de gavião-real?
Tânia Sanaiotti – Contamos com uma equipe que faz o trabalho de prospecção (busca dos ninhos na floresta), composta por biólogos e escaladores. Quando um novo ninho é encontrado, eles vão até o local para confirmar ou não a presença da espécie Harpia. O monitoramento é feito com a ajuda de bolsistas do programa, funcionários de parques e reservas, além de biólogos da Fundação Neotrópica, além de graduandos de Biologia que trabalham como voluntários. O mapeamento é feito na Amazônia brasileira e tem por objetivo estudar a biologia da espécie.
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O projeto abrange os Estados do Amazonas, Pará e Rondônia, além de outros cinco ninhos do Pantanal e na Mata Atlântica. O estabelecimento de uma Programação Nacional de Conservação da espécie foi possível com a parceria de instituições federais, estaduais e privadas, Organizações Não-Governamentais (ONGs) internacionais, nacionais e regionais, além do poder público municipal.
Atualmente, já foram mapeados 75 ninhos no Brasil, sendo 37 no Amazonas, 20 no Pará, três no Acre e em Rondônia e dois no Amapá. São investidos cerca de R$ 250 mil/ano sem contabilizar os salários dos profissionais das instituições envolvidas.
Agência FAPEAM – O gavião-real encontra-se ameaçado de extinção?
Tânia Sanaiotti – Ele encontra-se na lista brasileira de quase ameaçado e, internacionalmente, na categoria NT, que também significa espécie quase ameaçada.
Agência FAPEAM – As comunidades do interior têm ajudado na conservação e identificação dos ninhos? Como funciona o trabalho com as comunidades e quais as alternativas dadas como forma de subsistência?
Tânia Sanaiotti – A participação ativa de comunidades que habitam a floresta, no entorno das árvores com ninhos de gavião-real, são também a razão do sucesso na localização de novos ninhos, na coleta de dados sobre a espécie, por exemplo, coletando vestígios de presas para descrever a dieta da espécie, e monitorando a sobrevivência dos filhotes até serem capazes de voar para longe da área onde nasceram e estabelecer sua própria área de nidificação. As pesquisas utilizando a telemetria (medição) convencional e por satélite, iniciadas em 2004 e 2007, respectivamente, favoreceram o conhecimento do deslocamento local e regional do gavião-real. Os estudos genéticos, iniciados em 2005, ampliaram para o Brasil, as coletas de dados para as diversas regiões de ocorrência histórica e atual da espécie. As comunidades também têm ajudado, em especial diminuindo a caça e disseminando as informações entre as outras comunidades. Esse trabalho tem ajudado no retorno de notícias de novos ninhos.
Nas comunidades realizamos reuniões para detectar demandas de capacitação dos caboclos e ribeirinhos. Em parceria com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e outras instituições municipais promovemos oficinas, feiras de ciências, nas quais os alunos das escolas locais têm a oportunidade de participar, enquanto os pais recebem treinamento técnico sobre meliponicultura, adubo verde, canteiros demonstrativos, horta comunitária, viveiro de mudas, etc.
Agência FAPEAM – Além do gavião-real, o projeto apoia a conservação de outros animais?
Tânia Sanaiotti – Atuamos proporcionando a sobrevivência da fauna de vertebrados arborícolas e terrestres. A maioria das espécies de mamíferos é beneficiada com a manutenção da reserva legal e das propriedades onde os ninhos estão localizados. Arborícola é o termo utilizado para animais cuja vida se dá, principalmente, nas árvores, tais como muitos primatas, aves, cobras e insetos. Outra espécie que também ajudamos a preservar é o uiraçu-falso (Morphnus guianensis), que é uma ave bem semelhante ao gavião-real, porém é um pouco menor e ocorre na mesma área da Harpia.
O mapeamento de ninhos na Amazônia em muitos casos trouxe surpresas, pois ao se chegar na base de uma árvore com ninho, identificou-se que não se tratava de um ninho de gavião-real, mas de um uiraçu-falso ou de um gavião-de-penacho (Spizaetus ornatus), sendo que os registros de uiraçu-falso e do gavião-de-penacho na natureza são tão raros quantos os do gavião-real. Nestes casos, o Programa adotou estas outras águias de grande porte do Brasil e o monitoramento hoje atinge seis ninhos de uiraçu-falso e seis de gavião-de-penacho.
Agência FAPEAM – Quais informações o projeto conseguiu obter para contribuir com a preservação do gavião-real?
Tânia Sanaiotti – Temos informações de transmissores via satélite que demonstram que a espécie é muito robusta e responde bem se reintegrada à natureza. Por exemplo, um indivíduo baleado, com asa quebrada, e após fratura consolidada e reabilitada foi reintegrado na Rodovia AM-010. Ele está se deslocando há 11 meses pós-reintegração a uma distância de 60 km, indo 30 km retornando 30 km para a mesma região onde foi reintegrado. Para ter sobrevivido e voado tanto, com certeza está caçando muito bem. O que demonstra que vale a pena todos os esforços para devolver os animais feridos à natureza, quando respondem bem ao processo de avaliação e reabilitação.
Apoio
O Programa Brasileiro de Conservação do Gavião-real é uma iniciativa do Inpa, em parceria com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), entre outras instituições. As pesquisas desenvolvidas sobre a espécie são relacionadas à biologia, educação ambiental, oficina com as comunidades e na reabilitação de animais feridos e contam com o apoio da FAPEAM.
Luís Mansuêto – Agência FAPEAM