Amazônia é vista pela mídia como intocável, afirma pesquisador
28/10/2011 – A Amazônia ainda é vista pela mídia como algo intocável, exótico e que deve ser preservado. Os aspectos humanos, socioculturais são esquecidos entre tantas reportagens. É como se na região não vivessem pessoas, como caboclos, indígenas e ribeirinhos. As notícias nacionais e internacionais, em sua maioria, abordam temas relacionados ao desmatamento, aquecimento global, exploração de recursos, monitoramento via satélite, entre outras. Esses e outros assuntos foram debatidos durante o painel “A Produção Jornalística sobre Ciência, Tecnologia, Inovação (CT&I) e Meio Ambiente na Amazônia”.
Os debates sobre cobertura jornalística contam com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM), Associação de Correspondentes Estrangeiros de São Paulo (ACE), Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas (SDS) e Suframa.
O encontro ocorreu nesta sexta-feira (28/10), e faz parte da Jornada de Seminários da 6ª edição da Feira Internacional da Amazônia (FIAM), que ocorre no Studio 5 Centro de Convenções até este sábado, 29/10.
Durante o painel, o jornalista e professor da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP), Ricardo Alexino, a cobertura jornalística praticada pelos jornalistas nacionais também têm uma visão estrangeira diante da realidade amazônica. A justificativa dada é porque o profissional é carregado de subjetividade, além dos conceitos já estabelecidos no imaginário da pessoa.
Segundo Alexino, as pessoas no eixo Sul e Sudeste construíram mitologias sobre as realidades amazônicas, reflexos do inconsciente coletivo da influência histórica produzida pela própria mídia. Ele ressaltou que as informações produzidas pelos jornais impressos, cinema, filmes, documentários e jornais televisivos é de que desenvolvimento envolve destruição da floresta, construção de edifícios, grandes avenidas e que a floresta está relacionada ao atraso.
“A floresta é vista como exótica, que deve ser explorada, com recursos inesgotáveis. Contudo, o pensamento mudou um pouco com a Eco 92. Na época, passou-se a pensar sobre a preservação da natureza, mas sem o lado humano, como se o homem não fizesse parte. O povo da floresta desaparece. Temos que preservar para depois explorar. É algo cruel e perverso, que envolve questões econômicas e relações de poder”, pontuou Alexino, que perguntou ao público presente o que é preservar a floresta?
Para Alexino, as práticas jornalísticas pararam no tempo, uma vez que a cobertura das notas diárias é feita sem a devida reflexão. Ele crítica o modelo ao dizer que a enxurrada de notícias cria uma paralisia. “As pessoas assistem o jornal televisivo e não conseguem dizer quais notícias foram apresentadas. Precisa-se pensar se o jornalismo está contribuindo para a mudança da realidade”, ponderou.
COBERTURA JORNALÍSTICA NA AMAZÔNIA
O professor criticou a cobertura sobre a Amazônia. Ele explicou que a impressão que se tem é de que a impressa atua, em alguns casos, de forma publicitária, por exemplo, a biopirataria versus indústria farmacêutica é pouco abordado, quando ocorre é de forma pontual.
As realidades socioeconômicas e culturais dos povos indígenas, conforme o professor,aparecem de forma folclórica. “Nas reportagens nacionais sobre naufrágios no rio Regro as pessoas não têm nome, identidade. Elas não farão falta.
Na cobertura do acidente aéreo da Tam, em São Paulo, ocorre o contrário. Por que a Amazônia é considerada estrangeira ao próprio país?”, questionou.
Atuação da FAPEAM na divulgação científica
A Fundação de Amparo à pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM), destacou Alexino, atua de forma decisiva na divulgação científica da região. Ele disse que o trabalho do Departamento de Comunicação da Instituição deve continuar e mostrar para os jornalistas do Sul e do Sudeste que a Amazônia também é Brasil.
Para o jornalista e diretor-chefe da revista Novo Ambiente, Edemar Gregório, a cobertura de temas amazônicos está relacionada com a confiabilidade das fontes. Os repórteres também são orientados a não interferir no fato. Ele criticou que o problema está somente na cobertura do factual, pois temas relevantes tendem a não serem explicados à sociedade.
“Os jornalistas são orientados a coletar o máximo de informações. As matérias são realizadas em loco, bem como as fotos produzidas pelos repórteres fotográficos. A geração de hoje não tem ideia do que é fazer jornalismo sem internet. O resultado é o descaso com o público e, consequentemente, com a qualidade da matéria”, salientou.
A jornalista e professora da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Mirna Feitoza, moderadora da mesa, afirmou que a cobertura jornalística internacional envolve o global, o local e o regional. O reflexo é sentido nas matérias de CT&I e meio ambiente do Amazonas, do Brasil e do mundo. Ela explicou que o olhar sobre os fatos, por exemplo, do repórter que mora na capital sobre o município se torna estrangeiro. Na prática, o profissional também exclui os povos amazônicos, apesar de ser amazônico.
“Parece que o modelo atual de jornalismo se esgotou. A floresta, paradoxalmente, apresenta-se como uma solução. A prática jornalística não é mais isolada, pois todos têm acesso à internet, celulares, câmeras. O corresponde nos municípios amazônicos também se tornam internacionais”, finalizou.
No evento, também foi abordado o painel sobre “A repercussão das notícias da Amazônia no exterior sob a ótica de quem faz notícia”, com apresentação do jornalista da Globonews em Londres, Sílio Boccanera, que atua como correspondente brasileiro no exterior há mais de trinta anos. O outro palestrante foi jornalista Roberto Cattani, presidente da Associação de Correspondentes Estrangeiros em São Paulo (ACE) e diretor da Agência de Notícias da Itália – ANSA, atuando como correspondente da agência no Brasil desde 1991.
Foto1: Mesa com painelistas e moderadores do seminário.
Luís Mansuêto – Agência Fapeam